quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Vê se vira Gente!

 Quando o aluno chorou suas pitangas mesquinhas, o mestre impacientou-se de vez:

- Vê se vira Gente! Tem que ralar pra virar Gente, rapá. Acha que é assim fácil? É só nascer e, pronto... já é Gente? Né' assim não! Gente tem se responsabilizar pela sua própria transformação em Gente. Tem que se construir da renúncia. Da renúncia dos preconceitos herdados, das autocomplacências, do se achar um merecedor nato de aplausos; tem que renunciar a essas emoções adoecidas por tanto colo de pai e mãe ou adoecidas pela falta desses colos, o que dá no mesmo. Depois... Já vai achar que é Gente? É não, rapá ... Até aí é só um girino! Aí é que começa o grosso. Gente tem que se levantar da dor. É a única chance de, pelo menos, evoluir para um bípede. Gente se faz, e se é, na tentativa de entender a dor do outro. E, principalmente, na tentativa de entender a dor de ser Gente. Tem que conquistar essa humildade do não saber. Tem que abraçar um tronco de baobá de oitocentos anos e reparar o grão da sua criatura. Tem que atinar pro seu lasso rastro de poeira ante os deuses do Tempo e do Espaço. Agora, o seguinte: quando você já for esse macaco maravilhado com sua pequeneza, não vá se achar terminado. Aí, vai ter que perder o rabo preso nesse contentamento de ser miúdo e de, por isso, nada saber, nada poder, nada fazer ..e ir estudar. Éh, isso mesmo, aí o macaquinho tem que largar as culpas, as comiserações de ser um simples macaquinho e ir estudar. Gente, pra ser Gente, tem que apresentar sua participação. Tem que se comprometer. Entender-se como cidadão, situar-se na sua História, no seu país. Vigiar, combater, ou pelo menos, detectar as injustiças que nos açudam e afundam, as forças que reprimem as liberdades e o Belo. É justamente como grão que lhe cabe ser Grande. É como grão que você tem que fazer revoluções...Vai ficar aí parado não; se achando agora uma purpurina incapacitada pela imensidão do universo. Vai estudar. Vai entender de que mucamba negra mamaram nas tetas teus ancestrais, de que cauim beberam e se alucinaram teus tataravós. Muito bem, a essa altura, o Homo Sapiens não é lá esses Sapiens todo mas já caminha pra algum lugar.. Acabou? Não senhor. É aí que você, como Gente, começa... No entanto, muito cuidado: Toda vez que der um passo nesse percurso agindo feito um herói grave e carrancudo que tem de enfrentar a vilania dos dias, toda vez que você tentar erigir do chão ao Homem se levando muito à sério, sem se dar conta do ridículo desse movimento, sem conhecer o bem maior do humor, do encantamento, do prazer e do riso... aí, rapá, cê volta a ser girino imediatamente.

 O aluno, com a alma desabotoada, voltou do frio de si na pergunta do mestre:

 _ Mas, vamos lá, do que você estava se queixando mesmo?

 _ Nada, nada não, mestre.

 _ Então volte pro palco pra gente continuar o ensaio.

O aluno era eu, aos 17 anos. O mestre, Almir Terceiro Teles, virginiano desse 25 de agosto.

Almir formou muita Gente em mais de 30 anos atuando como professor de teatro no Rio de Janeiro em importantes estabelecimentos de ensino como a CAL, Casa de Artes de Laranjeiras e os Colégios Santo Inácio e São Vicente de Paulo, onde fundou os grupos 'Calabouço' e 'Faz Escuro Mas Eu Canto'. Também formou Gente como diretor do grupo Sarça de Horeb que ora completa 23 anos e pelo qual já passaram muitos elencos. Toda essa gente já teve a sorte de impacientar o Almir e tomar uma iluminação na testa. Ao todo..o quê? Uns oito mil alunos..não, são mais..aí, se contar as platéias afetadas por seus espetáculos, por suas idéias, é gente que não acaba. Bem, todos ficamos para sempre mordidos da vontade de ser mais Gente. Eu tento todos os dias mas creio permanecer numa fase elementar, tipo plâncton. O curioso é que o próprio Almir, até onde sei, teve que aprender a se virar Gente sozinho, saiu do Ceará para o mundo já com a estocada daquele anjo maroto que lhe descera no dia do nascimento e, abrindo uma clareira na Serra da Meruoca,  disse: Vai, Teles, ser Mestre na Vida!



sábado, 18 de junho de 2011

MARIA FERNANDA MOTA


NA PELE CLARA DE ECRÃ
PASSAM CORES VIVAS
QUE AÇULAM A PUPILA
QUE NEM O SOL DA MANHÃ
TEM NO FILME ALEGRIA
VAI SEMPRE ENCHER DE AFÃ TODO FÃ
TEM MISTÉRIO NA FITA
NO PLOT DO ELAN DA MOÇA PAULISTA
FEITA MARIA BONITA. 

COOL ÉLÉGANCE NORDESTE
AUDREY CAJUÍNA
A NOIVA DA QUADRILHA
ARRASA NO RED CARPETE
NEO REALISMO MULHER
ENTENDE O AMOR ASSIM COMO QUER
NOIR NO MAR DO CEARÁ
DISCURSA PIADA SUJA SEM CULPA
EM PLENA AVANT-PREMIÈRE

AGRESTE NOUVELLE VAGUE
TEZ DE LOUÇA FINA
QUE ÀS VEZES SE ESPATIFA
SÓ PRA SE RIR DESSA CENA
EM PRETO & BRANCO, MORENA
VAI, SEM QUERER, VER LÁ NO ACONCÁGUA
UM CARANGUEJO DE MANGUE
QUE TEM NA PELE A PORCELANA
MAS TEM O BARRO NO SANGUE. 




quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

YEMANJÁ    ( MÚSICA -  ANO 2001 )



YEMANJÁ SEREIA É RAINHA DO MAR
YEMANJÁ SEREIA É RAINHA DO MAR
YEMANJÁ SEREIA É

E DIZ QUE A DOR É A VIDA INTEIRA
CANTA À MARINHEIRA
E RECONVERTE A CORRENTEZA
CANTA À MARINHEIRA
E VAI PEDIR PELA BELEZA

ÁGUA TRAZ PARA AREIA
AS CONCHAS DE MAMÃE SEREIA
DEPOIS LEVA EM CADA UMA, UMA DAS VELAS ACESAS

TAMBÉM LEVA AS PALMAS BRANCAS
NA EMBARCAÇÃO QUE AVANÇA  N'AGUACEIRA

VAI PEDIR PELA BELEZA
MAR À BEIRA...VAI PEDIR...

QUE SE A VIDA É SOFRIMENTO
AO MENOS TENHA BELEZA,
E ARTE E AMOR DE ALENTO
PRA ESSA GENTE QUE MAREIA

EU VOU CANTAR, VOU CANTAR
PRA ELA VIR ABENÇOAR

VOU CANTAR, VOU CANTAR
PRA ELA VIR ABENÇOAR

E OLHA JÁ VEM LÁ
VEM NA MARÉ CHEIA
BATE PALMA, BATE CABEÇA
PRA IABÁ SEREIA

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

O Mindlim do Flat 



  O que acontece ao adicto bibliófilo que, de susto, tem que enfiar cinco mil volumes  num, para tanto,  diminuto apartamento? Doa os livros. A resposta fácil  não dimensiona devidamente o heroísmo do ato. Nada simples a abstinência de quem deitou uma vida sobre essa paixão: os livros.  Desfazer-se assim de tantos amantes, num só golpe, imagino seja de um desapego semelhante à iluminação de São Francisco. Ou um sultão entregando as próprias esposas ao carmelo. E foi isso que aconteceu com Ricardo Guilherme. É certo que ele já faria a doação de qualquer jeito, prócere protetor das artes que é e tendo, na hierarquia de sua alma, a magnanimidade ascendência sobre todo o resto. Mas consta que uma mudança repentina para o bem viver da beira-mar acelerou um pouco o desprendimento.

  Aí Fortaleza ganhou um acervo sensacional que está ali, ao alcance de todos, na sala DOC TEATRO no Pascoal Carlos Magno. Outros livretos de menor valor também defenestraram-se.  E agora, no apê do nosso RG , o feliz visitante já pode avançar dois ou três passos sem se desculpar por derrubar uma pilha de alfarrábios...mas não pense ele em bailar. No máximo, pode se espreguiçar com moderação. Sim, porque depois de doado oitenta por cento dos livros, o apartamento de Ricardo Guilherme continua mais biblioteca do que casa. Porém, fino decorador, RG solucionou tudo suprimindo dos armários, da cozinha, das gavetas, de toda e qualquer cavidade nos móveis e eletrodomésticos, alguns ítens supérfluos como, por exemplo, louça, comida e água.  E com essa habilidade espacial de destronar Burle Marx, agora sim, ao acordar na manhanzinha das duas da tarde, o Mindlim do flat na beira-mar relata conseguir, sem qualquer esforço, avistar as jangadas já dormitando sossegadas à sua frente. Mas não vá provocá-lo com anedotas a respeito desses fatos. Ricardo tem mostrado certa irritação ao desmentir repetidamente a história de que alguém tentou alcançar o pó de café no armário sobre a pia e acabou soterrado pelos trinta volumes da Comédia Humana. Ele jura que isso é mentira, argumentando que  a vida real não pode ser tão metafórica assim, no que lhe dou toda razão. Bobagem também o que andam dizendo sobre a faxineira que só fez perder tempo tentando arrumar a despensa e acabou com cinco Proust na testa. 


  Entanto, Marcelo Maciel, a quem o próprio Ricardo Guilherme batizou, com a costumeira precisão, de nosso Holligan com coração de cambaxirra, me segredou o que aconteceu quando foi  tentar  preencher o vazio de sua corpulência na geladeira ricardiana. Marcelo, que não consegue mentir nem para salvar casamento, por isso, e só por isso, não trai, me garantiu que deu-se a seguinte conversação entre ele e seu  anfitrião enquanto este, debruçado no computador, ia armando-se duma progressiva impaciência:

_ Ricardo, cê disse que tinha um vinho bordeaux e um queijo camenbert aqui na geladeira...mas...

_ Você  se confundiu, querido...eu disse que tinha Victor Hugo, Goeth e Rabelais na geladeira...

_ Ah, sei...Então vamos àquelas prometidas Cervejas no frezzer...Ué, cadê?

_ Outra confusão sua. Falei: Cervantes no frezzer... CERVANTES!

_ Ô Ricardinho, te visitar é tão bom pra minha dieta! Desta feita, vai ter aqui  uma ... Salada, legume fresco, verdura??

_ Na gaveta de frios? Só... Salinger, Hume, Ionesco e Neruda.

_ Tem pelo menos um sanduíche ? Pão com manteiga?

_ Não. Só Nietzsche com Poe e Montaigne.

_ Tá bom,  então vai ser isso...onde eu acho um prato?

_ Prato também não tem... Tem Plauto.. abre a despensa e pega: cê quer um Plauto, um Plotino ou um Platão?!

_ Tem colher?

_ Tem Voltaire.

_ Sal? Pelo menos Sal?

_ Bota Sartre, bota Sartre e acabou-se!! Sabe de uma coisa? Eu vou fazer um milkShakespeare pra você se aquietar e pronto!  

_ Só isso?

_ Shaw!

sábado, 18 de dezembro de 2010


A Praia do Futuro  ( música )

                                 para Cícero Teixeira Lopes


Guarda teus olhos
Pro que melhor puderes ver.
Apaga em ti este medo
De nunca saber
Se é destino teu
Ter um bem querer
Só a sóis viver
E se acender do breu.
Agua em ti este gelo
De neve haver no teu peito
Pra se derreter.
Desfibra ao sol o novelo,
Quebra da concha o segredo,
Que já desvelo ser certo:
Tens um coração que é tão belo,
Fizeste castelos na Praia
Do Futuro que queres ruir...

Guarda o velho
Todo o princípio,
Guarda um menino em ti.

Místicos rumos,
Velhos amigos,
Guarda um beijo pra mim.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Nunca esqueci as definições brilhantes em forma de epítetos que uma figura acolá deu para três cantoras.
Não conheci esse autor, a história foi-me repassada. Mas imagino-o metido naquele chambre por cima do pijama, enfumaçado de cigarrilha, com todo bocejo blasé de que uma bicha fina é capaz quando encara rodinhas de gente embriagada tagarelando sem propriedade sobre música. Alguém o cutuca pedindo opiniões a respeito de alguns nomes óbvios. E ele dispara instantâneo e resoluto como aquele que responde quatro quando perguntam quanto é dois mais dois:

O que você acha de Elis Regina?

_ Uma Máquina !

Maria Bethânia?

_ Feiticeira !

Nara Leão:

_ Não viveu... mas parece que viveu !

Quem ouve a mocinha da zona sul carioca que foi pioneira em cantar a favela sabe:  ''Não viveu mas parece que viveu'' é uma frase tão genial que deveria constar em enciclopédias ao lado do verbete Nara Leão.

Pois bem, a história me inspirou a brincadeira. Pelo prazer que as coisas inúteis dão, tentei lançar epítetos para outros tantos nomes. Sobre os quais, infelizmente, não me chegaram as definições da bicha fina, que certamente, são as definições verdadeiras, exatas, enciclopédicas. Repito: será um exercício inútil. Não tenho a menor pretensão de alcançar o brilho da bicha fina. Não que me falte a bichesse, me falta a finesse.  


GAL COSTA:  ORQUESTRA DE CRISTAIS

NANA CAYMI:  VOZ QUE FAZ SOMBRA, PÕE REDE E AINDA FICA TE BALANÇANDO...

ELBA RAMALHO:  UM CIO ETERNO

CLEMENTINA DE JESUS: QUANDO DESCE NO TERREIRO AS OUTRAS ENTIDADES SE AJOELHAM.

ELZA SOARES: MÁRTIR  DO SAMBA, RESSURRETA!

CLARA NUNES: LUZ PARA SE AVISTAR DO ALTO MAR.  TODOS OS FARÓIS, DE TODA A COSTA BRASILEIRA, DEVERIAM SE CHAMAR CLARA NUNES.

MAYSA: UM DIA DE CHUVA, UMA GRANDE CAIXA DE BOMBONS, DENTRO DE CADA UM, UMA LÁGRIMA.

FHÁTIMA SANTOS: O BRASIL É GRANDE MAS O CEARÁ É MAIOR

IVETE SANGALO: QUE A DILMA NÃO SAIBA, MAS É IVETE SANGALO A MULHER QUE  VERDADEIRAMENTE DETÉM O PODER NESTE PAÍS. ELA ORDENA ''TODO MUNDO PRA LÁ, TODO MUNDO PRA CÁ'' E ACONTECE ALGO IMPRESSIONANTE:  TODO MUNDO OBEDECE.

DOLORES DURAN:  PARA AS DORES QUE DURAM

CÁSSIA ELLER: SEU CANTO BATE NA CARA DO CAPITÃO NASCIMENTO E DIZ: PEDE PRA SAIR!

ÂNGELA MARIA:  MATRIARCA

ARACI DE ALMEIDA: PATRIARCA

ALCIONE: PRA FICAR  MARROM MENOS EMBRIAGADO!

RITA LEE:  AMERICAN WAY OF BRAZIL

ÂNGELA RORÔ: AQUELA TREPADA DEPOIS DA BRIGA !

ADRIANA CALCANHOTO:  ONDA QUE NÃO BRIGA COM O ROCHEDO, NAMORA.

DALVA DE OLIVEIRA:  A ÓPERA NA BATUCADA

CARMEM MIRANDA:   THOMAS EDISON DE TURBANTE E SALTO  PLATAFORMA. INVENTOU DE TUDO, INVENTOU ATÉ...  O BRASIL!

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

 pessoas focadas na vida
A VALSA DOS GIRASSÓIS ( MÚSICA)

                                     PARA ROSANA RODRIGUES

ELA QUER DANÇAR
SE VOLTAR
PARA ONDE UM GIRO
A LEVAR
ELA QUER GIRAR
ESCAPAR
DE ONDE O FIO É TENSO.
E A LINHA RETA
QUER GIRAR.

ELA QUER O MUNDO
ASSOPRAR
QUEM LHE DERA TUDO
O FUNDO, O MAR
QUEM LHE DÁ MAIS AR?
GIRA O MUNDO
ATÉ SUFOCAR
E SUSPENSO O CHUMBO
QUER DANÇAR

ELA QUER FUGIR,  ESPIA LÁ ELA QUER IR
ESPIRALAR ATÉ SUMIR,
ELA QUER SUBIR NO SOL
E DEPOIS CAIR, CAIR EM SI MAS VAI RODOPIANDO ASSIM
SE REPETIR
VAI VOLTAR
VAI QUERER VOLTAR PRA MIM
GIRASSOL
ATÉ O FIM.